quarta-feira, 24 de novembro de 2021

Contos de Guerra de um pacifista

 

    O primeiro que li foi Guernica-1937. Um amigo meu, dentista, Fábio Zardo, me enviou via Whatsapp, sugerindo a leitura e solicitando um retorno com a minha opinião sobre a história. Era um conto muito breve, cerca de duas páginas, sobre uma garça branca, chamada Tuk, responsável por uma das mais perfeitas manobras de guerra de que se têm notícia. Gostei muito e, claro, avisei meu amigo que disse que providenciaria um encontro com o autor da obra. Fato que aconteceu algum tempo depois quando mantivemos uma conversa bastante amigável via internet.

     Antes do encontro virtual, no entanto, eu já havia adquirido o livro do médico/escritor paranaense Azarias Porto Ribeiro. Nas páginas centrais estava a história de Tuk, a garça branca, minha conhecida, misturada a outros contos, igualmente, criativos e muito bem escritos. 

    O poeta é realmente um fingidor. Azarias nunca foi soldado, não foi pra guerra, é um pacifista, mas escreve sobre o tema como se fosse conhecedor.  Na conversa que tivemos, tranquilo, como um bom pacifista, ele comentou sobre sua obra e o prazer que sente ao escrever.

    Contos de Guerra (2020) é, por este ângulo, paradoxal. Um grande desafio vencido pelo escritor que conseguiu narrar acontecimentos da vida em meio a um cenário de mortes.

    São treze contos agradáveis de se ler. As batalhas ficam realmente como pano de fundo e em nada interferem nas narrativas criativas, emocionantes, românticas, engraçadas e fantásticas criadas pelo médico nascido em Primeiro de Maio, pequena cidade do norte paranaense. Além de Guernica, me impressionei com Stalingrado - 1942 e seu personagem analfabeto amante de poesias, com Normandia-1944 e o pescador que salvou uma sereia e recebeu um dos melhores presentes da vida ou ainda com a mãe que tira o filho do front e salva-lhe a vida em Norte da Europa - Séc. 18 e o elefante que impede uma batalha por gostar de banhos demorados na história Carolina do Sul - 1863.

    Enfim, Contos de Guerra serve para lembrar de como é bom ler algumas historinhas curtas de vez em quando. É prazer garantido! Bons amigos servem para indicar bons livros.

segunda-feira, 15 de novembro de 2021

Oliver Twist é genial e fácil de ler

     David Wark Griffith foi um dos primeiros revolucionários do cinema. Ele mudou um paradigma e criou um jeito de fazer cinema que permanece até hoje. Num tempo em que o cinema imitava o teatro, isto é, as cenas eram filmadas, do começo ao fim, de um único ângulo, ele ousou com closes e movimentos de câmera. As mudanças provocaram reações gerais, tanto de produtores quanto de atores, que diziam que a plateia pagava para ver os personagens de corpo inteiro. Além disso, observavam com severidade, como poderiam os espectadores compreender os saltos no tempo e espaço. Uma das respostas do inovador diretor era de que Charles Dickens escrevia assim. O escritor inglês era uma de suas maiores inspirações para fazer o novo cinema.

    Griffith enalteceu a obra de Dickens e as duas artes se cruzavam intensamente já lá nos idos de 1910.

    Foi a partir da leitura da obra do cineasta que me interessei por ler Dickens e o primeiro livro que deliciosamente devorei página a página foi Oliver Twist.

    O menino órfão, que dá nome à história, acaba se juntando a uma gang que procura iniciá-lo em uma vida de crimes. É Londres no século XIX, capitalista e injusta, que leva o menino ao submundo da sociedade. A partir daí ele vai comer o pão que o diabo amassou nas mãos de tipos deploráveis que cruzam seu caminho.

    Dickens é mestre na descrição das personagens e faz o leitor se apaixonar pela história. A riqueza de detalhes de cada uma é impressionante, criando imagens que ficam marcadas na mente de quem lê.

    A crítica social é bastante presente na obra, realçando a pobreza generalizada, a grande distância entre ricos e pobres, violência, pessoas e instituições corruptas que agem sempre em busca de dinheiro, pensando em levar alguma vantagem.

    Enfim, uma obra genial como foi também o trabalho cinematográfico de David Griffith que, por razões óbvias, reconheceu o talento do escritor inglês e mudou o cinema.

    Uma ótima leitura!!


quinta-feira, 4 de novembro de 2021

Sapiens – Uma breve história da humanidade ou a história do terrorista do ecossistema?

 

    Ler Sapiens – Uma breve história da humanidade (2011), de Yuval Noah Harari foi, no mínimo, intrigante. Logo de cara ela faz um relato revelador sobre a característica devastadora do homo sapiens ao longo de sua evolução enquanto se espalhava pelo planeta. Segundo o autor, as primeiras vítimas teriam sido as outras espécies humanas como os neandertais que desapareceram na disputa pelo meio ambiente. Assim como conhecemos diversas espécies de ursos ou felinos, por exemplo, havia espécies diferentes de humanos. O homo sapiens atravessou o oceano para chegar a Austrália e transformar o ecossistema do continente, fazendo desaparecer a megafauna composta por animais como cangurus de 200 quilos e coalas gigantes. A epopeia humana seguiu para a América, onde os caçadores coletores dizimaram dezenas de grandes espécies, entre elas, mamutes, mastodontes e o tigre-de-dente-de-sabre.

    Harari não perdoa a espécie humana e a qualifica, ao final, de terror do ecossistema. E assim, segue na tentativa de resumir o processo evolutivo humano.

Obras como esta, tão ricas em informação, podem causar impactos diversos no leitor conforme os preconceitos de cada um. Cada um se envolve ou se deixa envolver por este ou aquele aspecto. É possível encontrar no livro uma teoria interessante defendida pelo autor ao concluir que a humanidade era mais feliz antes do período agrícola. Os caçadores-coletores levavam uma vida mais saudável. A ideia de que os agricultores levavam uma vida farta e agradável é uma fantasia, diz ele no capítulo “A maior fraude da história”.

    A partir de 70 mil anos atrás o homo sapiens desenvolveu novos saberes e novas formas de comunicação tornando-se, assim, o ser humano de nossa atualidade. Antes disso, surgiu o desafio de adaptar-se a posição ereta. As mulheres sofreram mais, pois andar assim exigia quadris mais estreitos, apertando o canal do parto, por exemplo. É por isso que no ser humano ocorre um nascimento dolorido e precoce. Mesmo sem estar pronto, o bebê é obrigado a nascer. Enquanto em outras espécies os filhotes saem caminhando e até trotando, os humanos são extremamente frágeis.

    Por fim, fica uma discussão interessante e sempre atual sobre a criação da inteligência artificial e a busca pela imortalidade, desejos alimentados pela eterna insatisfação humana.

    Que livro!!


terça-feira, 26 de outubro de 2021

Uma História da Leitura com muitas histórias

 

    O psicólogo James Hillmann afirma que a pessoa que leu histórias ou para quem leram histórias na infância “está em melhores condições e tem prognóstico melhor do que aquela à qual é preciso apresentar as histórias. […] Chegar cedo na vida já é uma perspectiva de vida”. A citação está presente no livro do argentino Alberto Manguel, Uma História da Leitura (1997). É uma das muitas passagens da obra que exaltam o valor da leitura e a importância dos livros na evolução humana. O autor nasceu em Buenos Aires, mas virou cidadão do mundo, pois morou na Itália, na França, na Inglaterra e no Taiti. Depois se tornou cidadão canadense.

    Manguel revela que aprendeu a ler sozinho, decifrando os caracteres logo aos quatro anos. “Foi como adquirir um sentido inteiramente novo”, escreveu. A escrita veio depois. Por isso, ele diz que a leitura precede a escrita. Tornou-se um leitor voraz enquanto permanecia em casa durante as ausências do pai que viajava muito nas funções de diplomata. Tinha uma biblioteca particular gigante à disposição. 


     No livro, narra experiências a partir de suas leituras.
E esclarece logo que o livro é o resultado de sua história da leitura, e não a única história. O trabalho de Manguel é enriquecedor. Conta trocentas mil histórias das mais variadas origens e para todos os gostos. Algumas não saem mais da cabeça da gente. Tem aquela de dois visitantes que chegam na residência de Santo Agostinho e flagram-no no silêncio do jardim no momento da leitura. Escondidos para não atrapalhar, espiam admirados o Santo ler com os olhos e não com os lábios, como acontecia naquele tempo. Era um período em que, alguns poucos privilegiados de então, evidentemente, faziam leitura em voz alta para grupos. Ler com os olhos não era uma capacidade comum.

    Outra passagem interessante é aquela em que o autor compara a leitura de pergaminhos em rolo com o que acontece hoje quando lemos num computador. Ele diz que voltamos ao antigo formato de livro que revelam apenas uma parte do texto de cada vez, à medida que “rolamos” para cima ou para baixo. Não é perfeita a comparação? Perfeita. Perspicaz, não é?

    Enfim, um livro memorável. A leitura fácil, graças ao estilo do autor, ajuda muito e faz o exercício fluir. Uma História da Leitura é uma viagem através do mundo. Ler, realmente é viajar.

quarta-feira, 6 de outubro de 2021

A Sociedade Midíocre de Juremir

 

    Já falei do Juremir Machado da Silva no texto anterior e falo de novo. Ele tem uma excelente coluna de opinião no jornal Correio do Povo de Porto Alegre. Tanto na edição impressa quanto na digital, ele consegue fazer análises muito aguçadas sobre acontecimentos diários que vão construindo a nossa realidade. Juremir comenta com a autoridade de quem fez o pós-doutorado (1998) na França orientado por Edgar Morin, Jean Baudrillarde Michel Maffesoli. É jornalista e historiador, autor de dezenas de livros e tradutor de muitos outros. Quando li A Sociedade Midíocre. Passagem ao Hiperespetacular: o fim do direito autoral, do livro e da escrita (2012), pude ver um pouco mais de um conceito frequentemente abordado por ele em sua coluna diária. A partir da ideia de que hoje em dia todo mundo é autor, todo mundo é escritor ou, pelo menos, aqueles que se manifestam pela internet assim imaginam, ele analisa o comportamento de nossa sociedade onde há mais emissores de mensagens do que receptores.

Juremir é jornalista e historiador

    Agora todos estão no palco, não há mais a divisão entre a plateia e o palco. Todos são celebridades no mundo do hiperespetáculo. O importante neste mundo não é exatamente a informação. Distrair passou a ser certamente uma estratégia de sobrevivência, inclusive do jornalismo. E a distração não suporta muito conteúdo. Um mundo chega ao fim, diz Juremir. Surgirá, na Sociedade Midíocre, enfim, o homem plenamente contemplativo, sem cérebro, ou com um cérebro reduzido a funções mínimas e também sem pernas, dado que todo o deslocamento será virtual.

    O autor conclui que será o fim dos autores, fim do livro impresso e do e-book. E, mais ainda, o fim da escrita. Começa um novo mundo.

    O livro todo é cheio de recortes com frases muito bem construídas que fazem o leitor refletir a cada passo. “A sociedade “midíocre” foi mais longe e deu visibilidade a personagens obscuros”, ele diz. Quer frase mais reveladora do que esta?

    Viva Juremir Machado da Silva!!!



domingo, 12 de setembro de 2021

Você vai ficar mais rico lendo O Capital no Século XXI

 

    Foi num texto do excelente colunista gaúcho do Correio do Povo, Juremir Machado da Silva, que encontrei uma boa storyline sobre a obra do francês Thomas Piketty. De acordo com o colunista, o economista francês Thomas Piketty ficou famoso ao provar que o capitalismo, deixado a si mesmo, concentra riqueza e não o contrário, criando ricos por herança, não por trabalho de cada um. A partir deste comentário de Juremir me interessei pela leitura. Em O Capital no Século XXI (2013) nos deparamos com um levantamento de dados impressionante sobre os caminhos percorridos pelo capital ao redor do mundo nos últimos 300 anos. Evidentemente, os dados de países desenvolvidos são mais precisos e também mais antigos. O autor buscou informações relacionadas as declarações de renda das populações. Neste sentido, o Brasil, praticamente ficou de fora das avaliações do escritor por ter criado uma legislação fiscal só recentemente, ou seja, há menos de 100 anos.


     Piketty faz a conclusão óbvia para quem tem um mínimo de percepção sobre as condições de vida atuais e nosso planeta, só que faz isso com um rico embasamento. Ele põe por terra a ideia da meritocracia, deixando claro que o universo dos mais ricos não muda. O fato de alguém furar a bolha, saindo de uma condição adversa, constitui-se uma exceção à regra que, ao mesmo tempo, serve para legitimar o sistema, passando a ideia de que funciona. Enfim, do jeito que as coisas andam nunca haverá distribuição de renda justa no planeta e os que têm mais terão cada mais.
Thomas Piketty, de esquerda sem ser marxsista.

Ao longo da leitura, parece ser uma expectativa legítima que o leitor queira saber o posicionamento do autor. Uma posição que parece ser óbvia, afinal, se ele condena o capitalismo como sistema capaz de tirar o mundo da pobreza. Piketty se revela de esquerda mas sem ser marxsista. Coisas de nosso tempo.

    Uma peculiaridade da narrativa de Piketty é o uso frequente de referências de romances de época como os de Jane Austen e Honoré de Balzac. Usa estes dois escritores para ilustrar como, no início do século XIX, as pessoas obtinham renda e faziam investimentos. Mostra com as obras como era lógico desdenhar o trabalho a favor do casamento pela riqueza.

    A leitura de O Capital no Século XXI certamente deixará o leitor mais rico, culturalmente, é claro. Mas, o enriquecimento não se dará do dia para a noite já que a obra exige um fôlego especial dado ao volume expressivo de páginas.

quinta-feira, 26 de agosto de 2021

O Poder dos Quietos

     Assisti a uma palestra com a escritora Susan Cain falando de “O Poder dos Quietos” no TED, instituição norte-americana que oferece palestras grátis na internet. Na rápida apresentação, característica destas palestras, ela me fisgou com o tema. Quando disse que possuía um livro no qual ampliava ainda mais a discussão, eu me interessei e logo encomendei a obra. O Poder dos Quietos (2017) foi uma grande revelação. Eu sempre fui o tal do aluno “invisível” em sala de aula. Ficava lá no fundão e não abria a boca pra nada. Quando era chamado para falar alguma coisa, eu mudava de cor, sentia falta de ar e a voz saia com dificuldades.

    Susan Cain me revelou algo que eu precisava saber há muito tempo. Segundo ela, não só em relação ao ser humano, mas, ao reino animal, de um modo geral, um terço das populações tem este comportamento introspectivo. O exemplo dos peixes ao redor do anzol talvez seja o melhor para explicar. Sempre há aquele grupo que se lança imediatamente para pegar a minhoca e há uma parte que fica rodeando a situação para atacar quando tudo estiver mais calmo. Estes últimos fazem parte do um terço que “pensa” muito antes de entrar em ação. 


     Em relação à sala de aula, ela diz que, não raro, os “quietos” são bons alunos, estudiosos, concentrados e que não atrapalham o andamento da lição do professor, mas sofrem com a pressão para serem o que não são, ou seja, crianças extrovertidas e com boa capacidade de expressão. São até hoje alvo de bulling dos colegas e mesmo de professores despreparados. Senti na pele muitas situações narradas pela autora. As boas notas que tirava quase nunca foram suficientes para fazer os professores entenderem que o meu potencial era aquele ali, o de um aluno quietinho, mas concentrado e que aprendia muito com os outros colegas.

     Susan Cain afirma que se trata de pessoas que gostam de escutar a falar, ler a ir a festas; que inovam e criam mas não gostam de autopromoção e que são responsáveis por muitas das grandes contribuições à sociedade.

    Depois que me tornei professor, pude aplicar esse conhecimento em sala de aula ao entender melhor como funciona a cabeça deste tipo de aluno. Tentei respeitar o tempo de cada um, mesmo nas aulas de oratório quando chegava o grande momento.

    É mais uma obra pra gente, sem alarde, bem quietinho, quase invisível, começar a ler e se conhecer um pouco mais. Os livros têm poder!


segunda-feira, 23 de agosto de 2021

Intrigas na colonização italiana

 

    Por conta de um projeto para escrever sobre a história de nossa família, fui atrás de leituras de livros sobre a imigração italiana. Li vários e um deles chamou muito a minha atenção. Não sei exatamente o porquê, mas não imaginava terem ocorrido desavenças mais sérias entre conterrâneos italianos em solo brasileiro. A partir de 1870 até os primeiros anos do século XX milhares de imigrantes atravessaram o Atlântico em busca de uma nova vida.

    A escritora gaúcha, Maíra Ines Vendrame, em sua obra, O Poder na Aldeia (2016), mostra que, como em qualquer outra sociedade humana, a vida nas vilas formadas pelos italianos teve momentos de atritos. O subtítulo do livro dá uma boa indicação da narrativa seguida por ela: “Redes sociais, honra familiar e práticas de justiça entre os camponeses italianos (Brasil-Itália)”. O trabalho da autora aborda o processo de colonização ocorrido no centro do Rio Grande do Sul, em Santa Maria, na colônia Silveira Martins, chamada de Quarta Colônia. A ocupação iniciou por volta de 1876 se estendendo até o início do século XX. 


    Maíra começa contando da morte do padre italiano Antônio Sório que havia atuado junto à colônia italiana durante 14 anos. Foi morto numa emboscada, atacado por três homens, recebendo golpes violentos no “baixo ventre”, conforme notícia corrente à época.

    Outro padre italiano, Vítor Arnoffi, também teria fim trágico. O suicídio cometido, de acordo com relatos, estaria ligado à gravidez da criada da casa paroquial. Além desses episódios, o livro apresenta atritos de natureza política e religiosa, ocorrências de transgressões sexuais, gravidez indesejada, a defesa da honra, bebedeiras, brigas de bar e mortes de vizinhos.

    Claro, o livro não trata apenas de temas turbulentos, mas reserva uma parte importante da pesquisa para apontar esta faceta da sociedade em formação. Pelo inusitado, ao menos para mim, esse viés da história  chamou muito a atenção.


     A pesquisa que resultou neste trabalho foi apresentada como tese para doutoramento em história na PUC/RS, em 2013. O brilhantismo da autora na abordagem foi reconhecido pela Associação Nacional de História (ANPUH/RS) com o prêmio de melhor tese de doutorado em 2015.

    Foi com enorme prazer que desfrutei página a página deste livro. Uma obra muito bem escrita que fala de um período importantíssimo de nossa história. Fiquei ainda mais feliz quando pude conversar com a autora através de uma reunião virtual e perceber o quanto ela está focada neste trabalho de pesquisa da imigração. Além da enorme simpatia, sem dúvida, Maíra é uma das pesquisadoras mais respeitadas neste campo atualmente.

    Foi uma das minhas melhores leituras.

segunda-feira, 16 de agosto de 2021

O Coração das Trevas em Apocalipse Now

     Quando assisti "Apocalipse Now" (1979), provavelmente em um cinema de Porto Alegre, em 1980, onde morava, não fazia a menor ideia do processo conturbado de produção e dos bastidores malucos que envolveram o filme. Tampouco sabia tratar-se de uma obra baseada no romance do escritor britânico de origem polonesa, Joseph Conrad, O Coração das Trevas, no original Heart of Darkness (1902). Fui atraído pela grande propaganda existente e comentários a respeito da trilha sonora roqueira com Rolling Stones, The Doors e Credence.  Dizem que o diretor Francis Ford Coppola usou muito improviso durante as gravações, alterando e incluindo cenas e falas na noite anterior às filmagens. Para tanto, levava por toda a parte o livro de Conrad. 

    Quando li O Coração das Trevas fiquei muito admirado com a narrativa e magnetizado pela história depois de saber da relação com o filme. Queria ler rapidamente para conhecer os detalhes do romance inspirador de Coppola.

    Na história original, o Capitão Marlow é incumbido de realizar uma viagem à procura de Kurtz, um comerciante de marfim que teria enlouquecido nas florestas africanas do Congo Belga. Na película,o capitão do exército norte-americano, Benjamin Willard, navega numa barcaça pelas florestas do Vietnã, em busca de um oficial de nome Kurtz.

    Ao concluir o filme, o diretor resumiu o inferno que foi a produção da obra: “Meu filme não é sobre o Vietnã, meu filme é o Vietnã”, disse.

    Só para ter uma ideia das confusões ocorridas durante as locações nas Filipinas, o protagonista Harvey Keitel foi trocado na última hora por Martin Sheen, Coppola teve um ataque de nervos, Marlon Brandon quase não termina de gravar as cenas finais e Martin Sheen teve um ataque cardíaco.

    Não dá para comparar filme e livro, mesmo porque, como alguém já disse O Coração das Trevas é inadaptável. O que ocorreu com Coppola e sua trupe foi uma inspiração na história de Conrad para uma nova construção, num novo formato. O filme ficou sensacional, mas livros serão sempre extraordinários, capazes de fazer nossa imaginação ir além, muito além do que qualquer outro formato é capaz de nos levar.



quinta-feira, 12 de agosto de 2021

Mirapólvora e Miraflores, canhões e flores

     Mirapólvora e Miraflores ficaram na minha cabeça. Minha memória não é precisa sobre o primeiro livro que li na minha vida. Mas, aquele resumo que tivemos que fazer sobre o clássico de Maurice Druon, na sexta série do ginásio, me obrigou a ler o Menino do Dedo Verde de cabo a rabo. Foi assim, por obrigação, que li um livro completo na adolescência. E talvez tenha mesmo sido esta a minha primeira leitura de uma obra literária. Aquilo não mudou minha vida, não me deu um novo rumo, não me tornou um leitor voraz, continuei sendo um aluno mediano de pouca leitura. Mas, a história de Tistu em sua cinzenta Mirapólvora, que viraria a florida e ensolarada Miraflores, ficou gravada em mim para sempre. O dedo mágico que fazia surgir flores em tudo o que tocasse deixou a gente imaginando jardins imensos e flores de todas as cores.

    Para aquele exercício de aula, a professora dividiu a turma em grupos de quatro ou cinco alunos. Cada qual com uma obra literária específica.  Sem muito preparo para isto, acabou que o resumo feito a várias mãos concorreu em volume com a obra original. A escrita à mão tomou várias folhas duplas de papel almaço pautado. Não recordo se obtivemos um bom conceito com a mestra, mas lembro das tentativas de dar cabo à tarefa e a minha percepção de que havia sido o único da equipe que realmente tinha lido a história completa.


 

    Foi por impulso que certa vez comprei uma velha edição do romance, num sebo de Curitiba, publicada em 1976, já em estado delicado de conservação. Guardo comigo o exemplar até hoje que serve como uma janela para relembrar um tempo da vida de pouquíssimas leituras, muito futebol e brincadeiras de rua. Mirapólvora e Miraflores, canhões e flores. 

    Registrar lembranças de leituras, registrar momentos e dizer como é importante começar a ler desde a tenra infância para o ato de ler não ser apenas uma obrigação escolar;  Talvez sejam estes os propósitos deste blog, também não sei. Escrevo, só.


Drácula de Stoker tem todos os elementos que conhecemos nos últimos 100 anos

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